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Diabetes Gestacional: o que é e como diagnosticar?

27 Janeiro 2023

Durante a gravidez algumas mulheres poderão desenvolver diabetes, denominada Diabetes Gestacional. Por norma, a Diabetes Gestacional tende a desaparecer com o fim da gravidez, mas, durante a mesma, pode apresentar várias consequências para a saúde da mulher e do seu bebé. 

Segundo os dados da apresentação “A Diabetes em Portugal” efetuada na Conferência 1 do 16º Congresso Português de Diabetes em 2020, a prevalência da Diabetes Gestacional em 2018 foi de 8,8%, tendo-se registado um aumento ao longo da última década.

Para assegurar o bem-estar da mulher e do feto, é importante fazer um cuidadoso acompanhamento médico e diagnóstico, especialmente numa fase inicial da gravidez, para garantir que os níveis glicémicos se encontram dentro de valores normais e para, caso necessário, aplicar imediatamente estratégias regulatórias, caso se verifique a condição.

Este artigo tem como base dados e recomendações das principais entidades e organizações europeias e da Direção-Geral de Saúde (DGS), formadas de acordo com as orientações da  Organização Mundial de Saúde (OMS)

O que é a diabetes gestacional? 

A diabetes gestacional (DG) caracteriza-se pela presença de hiperglicémia (níveis de açúcar elevados no sangue) que surge pela primeira vez durante a gravidez e pode ocorrer em qualquer fase da mesma, no entanto, a sua frequência tende a aumentar a partir da 24.ª semana de gestação

Por norma, esta condição desaparece após o parto. Se a condição se mantiver após o nascimento do bebé, trata-se de uma diabetes tipo 2. As mulheres que durante a gestação desenvolvem diabetes gestacional têm um risco elevado de vir a desenvolver diabetes tipo 2 numa fase mais tardia, pelo que devem manter um acompanhamento médico regular após o parto. 

Quais são as causas? 

Durante a gravidez, o corpo passa por várias mudanças, como o aumento de peso e o aumento da produção de hormonas influenciadas pela placenta. Estas mudanças fazem com que as células do corpo utilizem a insulina — hormona produzida pelo pâncreas que tem como função a regulação dos níveis de açúcar do sangue, de forma menos eficaz, originando uma condição chamada resistência à insulina. Esta resistência conduz a um défice de insulina do corpo.

A diabetes gestacional ocorre neste sentido, quando o organismo não consegue aumentar a produção de insulina de modo a manter os níveis de glucose nos valores normais para a gravidez. 

Todas as mulheres grávidas criam alguma resistência à insulina, especialmente durante o final da gravidez, pelo que a ocorrência de diabetes gestacional é mais prevalente a partir da 24.ª semana de gestação, ou seja, no início do 3.º trimestre. Nesta fase ocorre um aumento das demandas nutricionais do feto, que cria uma maior necessidade de ingestão de hidratos de carbono por parte da mãe e, desta forma, uma maior exigência na produção de insulina. 

No entanto, algumas mulheres apresentam algum grau de resistência à insulina mesmo antes de engravidar, pelo que, quando existe a produção de hormonas pela placenta e o aumento de peso, a produção de insulina é ainda mais suprimida, o que torna este grupo de mulheres especialmente propenso a desenvolver diabetes gestacional.

Fatores de risco da diabetes gestacional

Qualquer mulher pode desenvolver diabetes gestacional. No entanto, o risco pode aumentar com os seguintes fatores:

  • Idade materna avançada
  • Obesidade — Índice de Massa Corporal (IMC) superior a 30
  • Gravidezes anteriores com bebés de peso superior a 4 kg
  • Diabetes gestacional em gravidezes anteriores
  • Familiares diretos com diabetes tipo 2

Quais os sintomas? 

Regra geral, a diabetes gestacional não apresenta nenhum sintoma. No entanto, em casos raros, algumas mulheres podem desenvolver sintomas se os seus níveis de açúcar no sangue forem muito elevados, tais como:

  • Aumento da sede
  • Aumento da frequência urinária
  • Boca seca
  • Cansaço
  • Visão turva
  • Candidíase

No entanto, muitos destes sintomas são comuns durante a gravidez e não são necessariamente um sinal de diabetes gestacional. A suspeita da condição também pode surgir durante a realização de uma ecografia fetal, se se constatar que o feto é grande para o tempo de gestação.

Por estas razões, as análises de rastreio durante a gravidez são a melhor forma de detetar esta condição e por isso altamente recomendadas. Além disso, é essencial haver um acompanhamento médico recorrente a partir do momento em que se tem conhecimento da gravidez. 

Consequências da diabetes gestacional

A maioria das mulheres com diabetes gestacional apresentam gravidezes normais e bebés saudáveis, não estando a diabetes gestacional associada a malformações. No entanto, níveis mal controlados de glicemia, podem originar algumas complicações, como:

  • Bebés demasiado grandes, provocando dificuldade no trabalho de parto e aumentando a possibilidade de parto induzido ou cesariana
  • Excesso de líquido amniótico, que pode aumentar o risco de parto prematuro (antes das 37 semanas) ou dificuldade no trabalho de parto
  • Parto prematuro
  • Pré-eclampsia
  • Hipoglicémia (baixa de açúcar) no recém-nascido nas primeiras horas de vida
  • Icterícia no recém-nascido

A diabetes gestacional também está associada ao risco aumentado de diabetes tipo 2 para a mãe e para o filho na idade adulta.

Diagnóstico da diabetes gestacional

Os critérios de diagnóstico da Direção-Geral de Saúde (DGS) e da OMS envolvem duas fases distintas: 

1.ª fase: avaliação da glicemia em jejum pedida na 1.ª consulta de vigilância pré-natal (8ª – 12ª semanas de gestação)

Interpretação dos valores de glicemia:

  • <92 mg/dL (5,1 mmol/L): implica a realização da PTGO, entre as 24 e as 28 semanas de gestação. 
  • ≥92 mg/dL (5,1 mmol/L) e <126 mg/dL (7,0 mmol/L): diagnóstico de diabetes gestacional, não sendo necessária a realização da PTGO. 
  • ≥126 mg/dL (7 mmol/L) ou um valor de glicemia plasmática medido ocasionalmente >200 mg/dL (11,1 mmol/L): indicia a existência de uma diabetes provavelmente anterior à gravidez. 

Os valores considerados normais durante a gravidez são diferentes dos da população em geral.

2.ª fase: Prova de Tolerância à Glicose Oral (PTGO)  

A PTGO é um teste que irá analisar a reação do corpo à ingestão de açúcar.

O exame consiste na ingestão de um líquido açucarado, com 75mg de glicose e deve ser feito com mínimo de 8 horas e máximo de 14 horas de jejum. Nos 3 dias anteriores, deve ser precedido de atividade física regular e de uma dieta não restritiva, contendo uma quantidade de hidratos de carbono de pelo menos 150 g diários. Durante a prova, a grávida deve manter-se em repouso. 

Os níveis de açúcar são medidos em 3 momentos:

  • Às 0 horas (ou seja, em jejum)
  • Após 1 hora
  • Após 2 horas

O diagnóstico de diabetes gestacional é positivo, quando um ou mais valores forem iguais, ou superiores aos seguintes valores de referência: 

  • Glicemia no início do teste: ≥93 mg/dL (5,1 mmol/L) 
  • Passado 1 hora: ≥180 mg/dL (10,0 mmol/L) 
  • Passado 2 horas: ≥153 mg/dL (8,5 mmol/L) 

Se o resultado da PTGO for inferior aos valores de referência descritos no quadro, a prova é assim considerada negativa, sem diagnóstico de diabetes gestacional. 

Saiba mais sobre análises em jejum no nosso artigo: O jejum é obrigatório para todas as análises?

O que fazer após o diagnóstico? 

Após ser feito o diagnóstico de diabetes gestacional e, de forma a minimizar qualquer risco de complicações, é essencial existir um bom controlo metabólico. Para isso é essencial monitorizar os valores da glicemia, através de avaliações periódicas, por punção capilar (picada no dedo), registando os valores, até ao final da gravidez. 

Desta forma é mais fácil compreender a evolução dos valores ao longo do dia.

Além da monitorização, deve ser adotado um plano alimentar saudável e personalizado, incluindo exercício físico moderado adaptado à gravidez. Também pode ser necessário iniciar medicação (insulina) quando o controlo glicémico não é suficiente com estas medidas.

Adicionalmente, deverá ser sempre feito o acompanhamento médico periódico e reforçar a importância da consulta pré-concecional caso pretenda voltar a engravidar.

Os bebés filhos de mães diabéticas devem realizar avaliações da glicémia à nascença e algumas horas depois, de modo a perceber se o bebé está a conseguir regular bem os seus níveis de açúcar.

E após o parto?

Todas as mulheres diagnosticadas com DG devem, entre 6 a 8 semanas após o parto, realizar uma PTGO com sobrecarga de 75 g de glicose com duas determinações: às 0 e às 2 horas.

A prova é considerada negativa quando os valores de glicemia em jejum forem <110 mg/dl (6,1 mmol/L) e <140 mg/dl (7,8 mmol/L) 2 horas após a sobrecarga de glicose.

No entanto, estas mulheres deverão sempre fazer uma vigilância de saúde regular com determinações anuais da glicemia em jejum, uma vez que têm um risco aumentado para desenvolverem Diabetes Mellitus.

As mulheres classificadas durante a gravidez com “provável diabetes prévia” devem também ser reavaliadas 6 a 8 semanas após o parto e a confirmação do diagnóstico deverá ter como base a definição de diabetes na população em geral.

Prevenção da diabetes gestacional

Quando se trata de prevenir a diabetes gestacional não existem garantias de que não irá desenvolver a condição, no entanto, quanto mais hábitos saudáveis adotar antes da gravidez, melhor. 

Se teve diabetes gestacional numa gravidez anterior, escolhas alimentares saudáveis e a realização de atividade física regular podem ajudar na redução do risco de voltar a desenvolver a condição em futuras gestações ou desenvolver diabetes tipo 2 no futuro.